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domingo, 11 de novembro de 2012

Conto: O SONHO




Do horário não me recordo ao certo, mas, nitidamente, recordo-me dos detalhes que marcaram minha noite.
Dormia como criança após, um dia de muita folia e brincadeiras. Sonhava com diversas coisas concomitantemente, misturadas e, tornando-se incompreensível.
Senti, entre sonho e outro, um toque despertando-me aos poucos, e mais ao fundo, uma voz, minha preferida, dizendo que tínhamos chegado ao nosso destino.
Lentamente, fui adaptando-me, ao barulho, às luzes, enfim, a tudo que me trazia, novamente, a realidade. Em um sobressalto, dei-me conta de onde estava, como estava, e o principal, com quem estava. Fiquei, subitamente, com raiva de mim por ter cochilado e, consequentemente, perdido alguns momentos com meu acompanhante.
Estava realmente zangada, mas um sorriso estonteante, me fez esquecer tudo, mesmo até, de respirar. O resto tornou-se, apenas, resto, nada mais preenchia meus pensamentos. Passei a contemplar aquele rosto até chegarmos ao nosso destino.
Enquanto descíamos do carro, a escuridão encobria nossas visões até que alcançamos a porta da casa, e como em meus sonhos, com todo cavalheirismo, “ele” a abriu para mim. Tudo corria bem, meu “amigo”, até o presente momento, eu, e o silêncio. Sós em um lugar distante da civilização. Passaríamos todo o final de semana juntos, e sem interferências.
Após guardarmos nossas bagagens, decidimos assistir um filme, romance pra variar, tudo conspirava a meu favor. Escolhemos o filme, começamos a assisti-lo. Uma história que me prenderia, se eu estivesse atenta às cenas que se passavam.
Resolvi ir até a cozinha preparar algo para comermos. Enquanto abria a geladeira, olhava a dispensa, fechava o armário, à procura de um aperitivo que despertasse meu interesse, ouvi um barulho fora da casa. Saí para ver o que era.
Aparentemente, tudo estava no seu devido lugar, até que, por estar desatenta, levei uma pancada na cabeça.
Não consegui deduzir quanto tempo fiquei desacordada, mas quando acordei, já estava no quarto, com a pessoa mais atenciosa do mundo cuidando de mim. Reparei que havia um curativo em minha testa, mas nem tive tempo de assimilar a ideia, pois meu médico fez um questionário para saber como eu estava me sentindo. Respondi que estava bem, um pouco tonta, mas bem.
A expressão fixada em seu rosto era angustiante, como se algo estivesse torturando-o. Fiquei confusa, preocupada. Repentinamente, aproximou-se ao pé da cama, atordoado. Então, em um átimo imperceptível, me abraçou como se quisesse assegurar que eu estava realmente bem. Assim permaneceu até se acalmar.
Não deixei transparecer, mas me sentia a pessoa mais feliz do mundo, recebendo tantos cuidados do meu doutor particular. Parecia um sonho, só que muito melhor, era real.
Queria permanecer abraçada para sempre, mas a curiosidade atrapalhou meus planos. Perguntei o que havia acontecido? O que acertara minha cabeça com tamanha força?
Cuidadosamente, afastando-me de seus braços, disse que algumas telhas da casa estavam se soltando devido ao tempo, e que alguns gatos, habitantes da redondeza, costumam brincar nos telhados fazendo muito barulho, e que por falta de sorte, uma das telhas se soltou e caiu sobre mim.
Acreditei em cada palavra, mas ainda não conseguia compreender por que ele ficara tão preocupado, e mais que depressa perguntei o motivo. Como se fosse a pergunta mais improvável, e obvia, do mundo, respondeu que era preocupação. Que não suportaria viver se algo ruim acontecesse comigo.
Fugiram-me todas as palavras. Será que tudo era real? Não conseguia reagir, mas sabia que minhas bochechas coravam e denunciavam minha satisfação em ouvir aquelas palavras. Um êxtase me dominava, podia sentir a adrenalina pulsando em minhas veias.
Como um romance materializando-se em minha frente, o mocinho, lenta e carinhosamente, envolvia a garota ingênua e apaixonada, em um beijo doce, demorado. Juntando inexperiência, desejo, vergonha, expectativa, tudo, em um único momento.
Quando os lábios de ambos se tocaram, percebi que não era um filme e nem um sonho. Tudo acontecia mesmo, era meu maior desejo se realizando.
Ao final do beijo, de todos os sentimentos que surgiram, o que se discrepou foi a timidez, então, enfiei meu rosto em seu peito, já que, àquela altura, seria difícil encontrar um buraco no chão.
Ouvi uma risada, sabia que ria de mim. Não me movi um centímetro se quer. Porém, engenhosamente, seus braços se moviam de forma que, mantinham-me junto dele, mas, também, lhe fornecia visão do meu rosto corado.
Em momento algum encarei seus olhos, faltava-me coragem. Queria fugir, correr pra longe, mas meus instintos não permitiam que me movesse, na verdade tudo estava maravilhoso.
Passara-se uma eternidade, até que resolvi encará-lo. E quando aconteceu, notei um sorriso, o mesmo pelo qual me derretia desde a primeira vez que o vi. Doce, suave, envolvente, perfeito. Materializavam-se todos os meus desejos.
Com aqueles olhos, examinando cada expressão que percorria minha face, ficava cada vez mais constrangida e, sem ação. Reparei que ele deliciava-se assistindo ao meu constrangimento, zanguei-me.
Seu rosto tornou-se sério, mas com ar despreocupado, curioso. Aproximou, lentamente os lábios da minha orelha e sibilou, fazendo com que uma corrente de calafrios percorresse meu corpo.
Escolhendo bem as palavras, perguntou se eu sentia algo de errado, pois não compreendia minha reação, ou melhor, a falta dela. Desencadeou as palavras, começou a desculpar-se e, enquanto afastava-se de mim aos poucos, notei em seu semblante, o mesmo que, eu mesma, sentia no momento, agonia, desespero, medo de nunca mais sentir a explosão de segundos antes.
Um momento se passou, e a distância entre nós aumentava, rápida e, dolorosamente. Não podia permitir que minha falta de atitude acabasse com meu conto de fadas. Desconheço de onde veio a coragem, mas recusei a distanciar-me mais, fui reaproximando nossos corpos e, parti para o ataque, o beijei. Tudo se tornava real. Enfim, os sonhos se concretizavam.
Ao fim de outro beijo, me aconcheguei em seus braços e, senti como se estivesse em uma fortaleza, e que nada poderia atingir-nos enquanto permanecêssemos ali, juntos.
Os minutos se passavam, sua boca percorria minha face. O hálito quente me fazia estremecer, os beijos seguiam-se por cada centímetro. Suas mãos descobriam meus medos, acariciavam meu rosto. Os dedos desenhavam caminhos por minha pele quente, dominada pelo calor de nossos corpos.
Corações acelerados, urgência nos lábios, ferocidade nos toques. Toques esses, que liberavam novos sentidos, novas conquistas. Movimentos da carne, gemidos de prazer.
Aos poucos, roupas eram jogadas ao chão. Sua boca descia por meus ombros, deslizando, percorrendo pontos significativos e, me fazendo tremer. Sentia sua língua passear por meu umbigo, dando voltas, como uma dança devastadora. Os pensamentos gritavam, os lábios produziam calafrios. Desciam às pernas, às coxas. A urgência só aumentava.
No auge dos desejos, quando me entregaria completamente, em um sobressalto, acordei ofegante.
Chamas se espalhavam por minha face, meus olhos transbordavam de tristeza, raiva, vergonha. A vontade de correr sem direção, a frustração por ser apenas mais uma ilusão. Lágrimas jorravam, levando, juntamente, cada detalhe que se formara em meus pensamentos.
A decepção dominava-me de tal forma que, apenas alguns minutos mais tarde notei a presença do protagonista de meus sonhos que, realmente, assustara-se com meu comportamento.
Como um déjà vu, ouvi sua voz perguntando se eu estava bem, se havia algo errado. As lágrimas surgiam com mais ferocidade, de um jeito que não conseguia controlá-las, tamanha era a raiva que explodia em meio peito.
Senti, de repente, mãos acariciando meu rosto, ao mesmo tempo, que, livrava minhas bochechas da umidade. Um tremor percorria minha espinha, fazendo-me recordar do sonho e, fixando que havia sido exatamente isso, um sonho.
Afastando-me bruscamente de seu toque, deixei seu olhar paralisado e, ao mesmo tempo, preocupado. O que passava em sua cabeça desconheço ainda hoje.
Já havia tido outros sonhos, mas aquele me parecera tão real, que foi difícil acordar e encarar a realidade. Novamente, ouvi os sinos que tocavam, ao som de sua voz. A voz do meu anjo caído. Dessa vez pesava, meticulosamente, cada palavra.
Devagar, aproximou-se e, cautelosamente, pediu para que me acalmasse.  Dizia que tudo estava bem, que não iria me tocar. Dizia também, para não temê-lo, pois seria incapaz de me  fazer algum mal.
Aos poucos fui voltando à sanidade. Respirava calma e profundamente, e logo, voltei a controlar minhas ações e pensamentos. A tristeza ainda transparecia em meu olhar, mas já não reagia com impulsos impensados e desnecessários.
Receoso, novamente, meu acompanhante, perguntou o que havia de errado. Por que o desespero de segundos atrás? Estava dominada pela tristeza, ainda que controlada, os devaneios passavam, como cenas de um filme, em meus pensamentos.
Não consegui me controlar e, mais uma vez, as lágrimas jorravam. A vergonha, por fazer papel de boba, já havia se hospedado e, se fazia presente em minha face, incrivelmente rosado. E sem entender como, desatei a falar, abertamente, do meu sonho.
Após o término da descrição e explicação, da minha raiva, me paralisei. A voz não saia, as lágrimas secaram, os movimentos não obedeciam às coordenadas, e o coração, esse utilizava toda a energia que restara. Estava tão acelerado, que mais parecia uma matilha desenfreada.
Notei, mais uma vez, no canto da boca, daquele que até o momento só me ouvira sem interrupções, um sorriso tímido, misterioso, e, por vez, prazeroso. Mas não consegui reagir ao mesmo.
Aqueles olhos negros se aproximavam, mais e mais, a cada instante, até que seus lábios sibilaram próximos ao meu ouvido, algo como, “A realidade pode ser tão boa quanto seus sonhos. Arrisco dizer, que pode ser melhor.” Foi o que bastou para que meus instintos ficassem à flor da pele.
Saltei-lhe ao pescoço, envolvia-o em meus braços e, perdi-me nos dele. Uma urgência, ainda maior que nos meus sonhos, provocante e felina.
A realidade e os devaneios aperfeiçoavam-se a cada toque. Um arroubo dominava meu corpo, meus pensamentos, meus movimentos. Passei a agir impensadamente. Apenas seguia meus desejos.
O prazer aumentava, mas não satisfazia por completo. Ansiava por saciar minhas vontades totalmente, chegar a plenitude do êxtase.
As línguas, hora se enroscavam, hora passeavam, pelos corpos, um do outro. Correntes de calafrios seguiam-se, uma após outra, por ambos, aumentando o êxtase e, tornando cada toque íntimo, avassalador. Gemidos passavam dentre os lábios. Palavras ditas, no auge de cada sensação, me faziam perder os sentidos, estremecendo ao ouvi-las.
Estava totalmente entregue, e sentia que também o possuía por completo. Juntos, dominávamos a dança dos loucos e, atingimos o nível, tão almejado, do prazer.
Lembro-me de acordar com a claridade em meu rosto. O sol, que emanava sua luz, ofuscava minha visão. Meus olhos, ainda sensíveis à luminosidade, procuravam por alguém, por um rosto, pois o corpo sabia, se materializava embaixo de mim.
Despertei devagar, preguiçosamente. E logo cheguei ao fim da minha busca, descobri seus olhos. Os mesmos, me examinando e, acompanhados de um sorriso, agora excitante, me faziam sentir calafrios, descendo pela espinha, até aproximar-se do ponto da minha feminilidade. Uma imensa felicidade preenchia meus olhos, meus pensamentos. Tudo emanava extrema alegria.
Enlaçados, permanecemos por mais algum tempo, até que senti seus lábios roçarem minha nuca e, sibilando: “Então, atingi todas as suas expectativas, ou deixei a desejar?”
Um sorriso malicioso fluiu de meus lábios, e antes que pudesse responder com palavras, já estávamos envolvidos, com a resposta, na prática.


                                                            SIMONE ROCHA

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